O corrimento vaginal é um dos principais sintomas
referidos em consultórios de ginecologia. Sua abordagem
correta depende da identificação das principais
causas de corrimento e de como fazer um diagnóstico
fidedigno, permitindo uma conduta mais coerente e
eficaz. A infecção vaginal é responsável pela maioria
dos corrimentos, decorrente freqüentemente de
candidíase, vaginose bacteriana ou tricomoníase.
Estima-se que a freqüência dos corrimentos seja de
5-15% em clínicas ginecológicas em geral, enquanto
que, em clínicas especializadas em doenças sexualmente
transmissíveis (DST), possa atingir 32-64%.
Não é possível diferenciar as causas de vaginite apenas
pelos aspectos clínicos, entretanto alguns autores
mostram que aspectos como sinais inflamatórios, odor
de peixe e medida do pH são capazes de aumentar a
sensibilidade no rastreamento dos corrimentos. Uma
análise criteriosa dos métodos diagnósticos disponí-
veis mostra aqueles mais adequados a depender da
suspeita clínica. Por fim, o tratamento adequado deve
ser instituído, baseado no diagnóstico correto, a fim
de que o sucesso terapêutico seja atingido.
A queixa de corrimento genital se constitui
em um dos principais sintomas referidos no
consultório de ginecologia. A abordagem médica
correta nestes casos envolve não apenas o aprofundamento
na sintomatologia e busca de sinais positivos (exame físico), mas também a utilização
de métodos diagnósticos com fins específicos e, por
fim, a prescrição do tratamento adequado.
Desde receitas populares até medicações de
última geração, várias opções vêm sendo utilizadas
no tratamento dos corrimentos vaginais, muitas
vezes ineficazes por serem impróprias para o caso
da paciente.
Qual será a conduta do ginecologista frente
às diversas apresentações clínicas dos corrimentos?
Este artigo buscou fazer um levantamento
atual de dados sobre as causas de corrimento e
como fazer um diagnóstico fidedigno, permitindo
uma conduta mais coerente e eficaz.
Principais Causas
Os corrimentos vaginais incluem as mais
diversas etiologias, infecciosas ou não. A infecção
vaginal é sua principal causa, decorrente, frequentemente,
de candidíase, vaginose bacteriana ou
tricomoníase. As causas não infecciosas abrangem
o corrimento fisiológico (por exemplo, durante o
período ovulatório), processos alérgicos, vaginite
atrófica (por deficiência estrogênica) e a vaginose
citolítica.
Como Diagnosticar?
Tendo em vista a alta freqüência dos corrimentos
vaginais e sua variedade de etiologias,
torna-se imprescindível o diagnóstico correto. Inicialmente,
deve-se atentar para as características
clínicas do corrimento. A candidíase típica manifesta-se
com um fluxo esbranquiçado, grumoso,
associada a ardor e prurido vulvar, dispareunia e
sintomas urinários. Já a tricomoníase caracterizase
por um corrimento amarelo-esverdeado, abundante,
bolhoso, com odor fétido.
O que é observado na prática, no entanto,
é que não é possível diferenciar as causas de
vaginite apenas pelos aspectos clínicos. Apesar
disso, um levantamento realizado evidenciou que
a presença de sinais inflamatórios torna maior
a suspeita de candidíase, enquanto que o odor
de peixe aumenta a probabilidade de vaginose
bacteriana (Anderson et al., 2004). Outro estudo
mostrou um aumento na sensibilidade no
rastreamento das vaginites, especialmente da
vaginose bacteriana, quando foram associados
sintomas clínicos e medida do pH maior que 4,5
(Thinkhamrop et al., 1999).
A vaginose citolítica é uma entidade freqüente,
apesar de pouco reconhecida, muitas vezes
confundida com candidíase devido às suas características
clínicas, apesar da vaginose citolítica não
apresentar hiperemia vulvar. Seu diagnóstico é
feito na ausência de microorganismos como Trichomonas,
Gardnerella e Candida; número aumentadode lactobacilos no exame a fresco; evidência de
citólise e pH entre 3,5 e 4,5
A vaginite descamativa inflamatória (VDI),
patologia pouco conhecida, vem sendo considerada
não como um diagnóstico propriamente
dito, mas como uma apresentação clínica de
diversas desordens, tais como líquen plano e o
pênfigo vulgar (Murphy, 2004). Trata-se de uma
vaginite exsudativa difusa, apresentando-se
com irritação vaginal ou dispareunia. Ao exame
físico, são observadas regiões eritematosas nas
paredes vaginais com fluxo aumentado. O exame
da secreção demonstra número elevado de leucócitos
e células epiteliais escamosas imaturas,
além de diminuição dos lactobacilos. Trabalhos
têm descrito a VDI como a forma mais grave de
uma entidade descrita recentemente, a vaginite
aeróbica. Ela está associada a microorganismos
aeróbicos, principalmente estreptococo do grupo
B e Escherichia coli.
Tratamento
Após ter sido feito o diagnóstico etiológico, é
essencial adotar uma conduta terapêutica adequada.
Os dados abaixo foram baseados nas orientações do
Ministério da Saúde.
Vaginose Bacteriana
O tratamento deve ser prescrito para todas
as pacientes sintomáticas, para as gestantes e para
pacientes que irão se submeter ao procedimento
invasivo. Neste último caso, ainda há controvérsia
se deve ser feita a profilaxia para todas as pacientes
ou o tratamento após terem sido rastreadas. Estudos
realizados mostram não haver melhora na resposta
terapêutica, nem diminuição de recorrências em
pacientes que tiveram seus parceiros tratados, não
sendo, portanto, recomendado o tratamento sistemático
dos mesmos.
Os tratamentos de 1ª escolha são Metronidazol
(500 mg, via oral, 12/12 h ou gel a 0,75%, uma aplicação
vaginal ao dia, por 5 dias) ou Clindamicina (creme a 2%,
uma aplicação vaginal ao dia, por 7 dias)
. Para gestantes,
o esquema recomendado e comprovado por vários
estudos é Metronidazol 250 mg, de 8/8 h, por 7 dias ou
Clindamicina 300 mg, VO, 12/12 h, por 7 dias.
A VB associada ao Mobiluncus pode ser tratada
adequadamente com o esquema de Metronidazol
500 mg - 3 vezes ao dia.
No caso de VB associada à Ureaplasma ou
Micoplasma, o tratamento recomendado é Azitromicina
1 g, via oral, dose única.
Os estudos mais recentes apontam para uma resistência
do Atopobium vaginae ao Metronidazol,
sugerindo ser este agente uma possível causa de
falha no tratamento.
Alguns trabalhos têm sido realizados a fim de
esclarecer qual o papel dos lactobacilos na etiopatogenia,
prevenção e tratamento da VB . Para o tratamento das recorrências de VB, o
CDC sugere utilizar outro regime recomendado, sem
haver, entretanto, tratamento de manutenção. O uso
de tinidazol, na dose única de 2 g via oral, vem sendo
estudado para os casos de VB recorrente, com bons
resultados
Tricomoníase
O tratamento considerado como de 1ª escolha
é Metronidazol 2 g, VO, em dose única. Estudos
mostram que a terapêutica tópica não é tão efetiva
quanto aquelas que utilizam a via sistêmica. Gestantes acima do 1º trimestre podem utilizar o
esquema por via oral. É imprescindível orientar a
abstinência sexual e tratar o parceiro, por se tratar
de doença sexualmente transmissível.
Candidíase
A terapêutica para a candidíase dispõe de
duas vias (tópica e sistêmica), sendo a eficácia
semelhante em ambas. Em nossa experiência, a
preferência pela via tópica se deve ao alívio mais
rápido dos sintomas e ao efeito local e psicológico
para as pacientes. Independente do tratamento escolhido, deve-se chamar a atenção
para o fato de não ser necessária a utilização das
duas vias simultaneamente. A terapêutica sistêmica
deve ser implementada nos casos recorrentes ou
de difícil controle.
Nos casos mais severos, recorrentes, causados
por Cândida não-albicans ou em pacientes imunocomprometidas (candidíase complicada), o
tratamento deve ser mantido por um tempo maior.
Costumamos utilizar em nosso serviço ácido bórico
a 3% em óvulos ou nistatina por 14 dias naqueles
casos em que foram detectadas espécies de Cândida
não-albicans.
As opções para as gestantes incluem miconazol,
terconazol ou clotrimazol tópico durante
sete dias. Investigação e tratamento dos parceiros
sexuais não são recomendados rotineiramente,
porém alguns autores preconizam sua realização
nos casos de candidíase vaginal recorrente.
Vaginose Citolítica
O tratamento consiste em elevar o pH vaginal,
utilizando duchas de bicarbonato de sódio
(30-60 g em 1 L de água morna, 2 a 3 vezes por
semana, durante 2 semanas). Nosso serviço costuma
dispor também de creme vaginal com tampão
borato pH 8,0 por 10 dias ou Clindamicina creme
a 2% por 7 dias. Nas recidivas, o tampão pode ser
mantido duas vezes por semana.
Vaginite Inflamatória Descamativa
Entidade de reconhecimento complexo, é
também de difícil tratamento. Alguns estudos têm
mostrado, no entanto, boa resposta com corticosteróides
associados à Clindamicina, via vaginal, por 14
dias, podendo-se manter, em longo prazo, duas vezes
por semana ou mensalmente.
Ao reconhecimento
dos sinais e sintomas, devemos realizar
testes diagnósticos para os corrimentos vaginais,
permitindo que o ginecologista adote uma conduta
terapêutica correta, efetiva e racional.
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